terça-feira, 11 de janeiro de 2011

A sucessão e o sem terra - “a hora de sair de cena”

Sempre digo às pessoas, que não conhecem a minha origem, que já fomos sem terra; morando em barraco de bacuri nos fundos da fazenda de um parente de meu pai, tendo cedido um pedaço de terra para que ele plantasse mandioca e criasse porcos, tirando deste trabalho o sustento da família, pois ele tinha que cuidar de quatro barrigudinhos e estava sem trabalho. Um dia falarei sobre controle de natalidade. Não esqueço desta fase da minha vida, por ter sido boa e também pelas lombrigas e de um remédio chamado abrol. Passados quase cinqüenta anos, estamos aqui em outra situação bastante privilegiada, hoje sou “Dotor Advogado”. Todos da minha casa fizeram um curso superior, graças à visão e ao trabalho daquele casal de sem terras. Mas para que tudo mudasse, além da força de vontade de meus pais, é preciso ter oportunidades e apoio de pessoas que ajudem a realizar sonhos.

Nestes muitos anos de reforma agrária, escuto vários comentários a respeito dos assentamentos, assentados, sem terras e acampamentos em beira de rodovia, sempre de forma pejorativa e desprezo. Muito raro ouvir um comentário decente sobre eles. Sou um estudioso, não de livros, mas de pessoas, sou um observador do dia a dia, meu pouco conhecimento é empírico, nada cientifico, contrariando a opinião geral, ouço muito e observo bastante.

Nós que tivemos a sorte de ser bem nascidos, não nascer com dinheiro, mas sim com pais preocupados com a educação e nosso futuro, que lutaram muito para evoluir e nos proporcionaram uma boa criação. Comecei a escrever este texto, por que muito me incomoda a maneira como os assentados e os assentamentos são julgados por seres humanos que dificilmente conseguirão ter o dom divino de “ser humano”. É muito fácil julgar e atirar pedras. Como já disse, sou um observador, principalmente do comportamento do mundo em que vivo, isto é, Bonito e adjacências.

Estudando o material disponível chego as minhas conclusões, “as besteiras do Tó”, como dizem alguns, não, muitos.

Em todos estes anos observando uma das grandes verdades da vida, a sucessão, vejo que todos aqueles que têm um bom patrimônio, empresários urbanos e rurais, são fieis seguidores de nossa amiga Elisabeth da Inglaterra, só vão sair de cena com a chegada da morte. Vejo filhos bem criados, boas escolas, sempre juntos com os pais em suas atividades, acompanhando, vivenciando, sempre juntos aos negócios da família, mas, quando formados, ou aqueles que não concluíram seus estudos, retornam para juntos dos seus pais, para começarem a trabalhar. Raramente recebem dos pais autonomia para administrar algum negócio da família, permanecendo os pais juntos aos filhos, monitorando o trabalho e o aprendizado dos mesmos. Passam os anos e eles ainda não estão suficientemente preparados para assumir a completa administração dos bens da família. Raramente o pai sai de cena para que o filho entre, o pensamento sempre é o mesmo, “se ele fizer uma cagada não tenho idade para recomeçar”.

Aí vem o poder publico, pega os acampados, originários de famílias pobres que nunca tiveram acesso as benesses da vida, as oportunidades dos bens nascidos, entregam a eles um pedaço de terra, um financiamento, uma assistência técnica bem brasileira - aquela que empurra com a barriga - Raramente conseguem entender o porque do ser humano. Jogam todos num balde e os tratam igualmente, não individualizam família a família, não estudam caso a caso. Como fazer isto se não tem material humano para o trabalho? Pegam pessoas que nunca tiveram nada, a não ser sonhos, criando em suas cabeças expectativas que nunca serão cumpridas. Normalmente para estas pessoas o pedaço de terra é a sua última chance de realmente ser um ser humano, assim como os bem nascidos, monitorados pelos pais, todos encontram uma muralha intransponível. Porque crucificar o pobre, se os bens nascidos não acreditam em suas crias?

3 comentários:

  1. penso como vc... vivemos num Estado provinciano cheio de preconceitos, filhos de papai q nunca terão maturidade para administrar seus próprios negócios por conta do protecionismo de seus pais! oportunidade para tdos, esse é o lema!

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  2. Tó, enxergo vários ângulos no mesmo tema. Acho que os bem nascidos duvidam da educação que deram a seus filhos ou sabem que fizeram furos na educação ou mesmo sabem que os filhos não apreciam aquele modo de vida mas tem que cuidar do "patrimônio" da família.
    Na semana passada ouvi um ditado de uma administradora de fazenda que dizia mais ou menos o seguinte: Avô rico, filho nobre e neto pobre!. E faz sentido porque normalmente o filho não recebe autonomia pra administrar, apenas estudar, usufruir e tentar imitar o pai e o neto herda as tentativas dos pais que sequer eram apaixonados por continuar o que os pais construiram. Enfim, o tema é complexo e cheio de pontos que nem imaginamos. Um abraço!
    Ana Carla Castello

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